
O ex-presidente Jair Bolsonaro, no Palácio da Alvorada Cristiano Mariz/Agência O Globo/10-10-2022
O ex-presidente Jair Bolsonaro gastou R$ 4,3 milhões em compras pagas com cartões corporativos durante os feriados e recessos que aproveitou em seus quatro anos de gestão, quase todos com passeios de moto e jet ski em praias do Guarujá (SP) e de São Francisco do Sul (SC).
O GLOBO analisou os dados referentes a 66 dias de folga em 16 viagens feitas pelo então presidente entre 2019 e 2022. O cálculo inclui pagamentos feitos por servidores do Palácio do Planalto que chegaram antes de Bolsonaro às cidades onde ele ficaria hospedado. Foram considerados apenas os gastos pagos com o cartão corporativo, sem incluir a remuneração pelas diárias dos funcionários destacados para acompanhar o ex-presidente. Isso significa que o valor total das viagens é ainda maior que os R$ 4,3 milhões.
Além do Guarujá e de São Francisco do Sul, Bolsonaro repousou em Salvador (BA) e em Eldorado Paulista, cidade do interior de São Paulo onde o ex-presidente passou a infância.
Do total gasto pelo ex-presidente, R$ 3,7 milhões foram desembolsados nos dias em que Bolsonaro esteve nessas cidades ao longo de seu mandato. Outros R$ 593 mil foram despendidos na véspera ou nos dias seguintes à estada do ex-presidente pelos assessores que o acompanharam.
A viagem mais cara da lista foi o réveillon do ano passado em Santa Catarina: R$ 633 mil só em despesas pagas com o cartão. Na ocasião, Bolsonaro foi criticado por curtir a praia em sua terceira viagem a São Francisco do Sul em um momento em que cidades da Bahia enfrentavam situação de calamidade por conta de alagamentos provocados por fortes chuvas.
O ex-presidente se hospedou no Forte Marechal Luz, uma área do Exército situada na barra Norte de acesso a São Francisco do Sul, nas vezes em que repousou na cidade catarinense. Parte dos seus gastos, porém, foi feita em regiões distantes de onde Bolsonaro circulou. Na lista de campeões de despesas está um posto de gasolina que recebeu R$ 164 mil em 15 atendimentos feitos nas visitas do ex-presidente ao município. Uma única transação, feita em 2 de janeiro de 2022, custou R$ 71,4 mil, valor suficiente para encher com 55 litros de gasolina comum o tanque de mais de 200 carros — a conta foi feita com base no valor médio do litro do combustível no estado divulgado naquela semana pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Os maiores gastos nas viagens do ex-presidente foram com hospedagem, totalizando R$ 2,5 milhões. Na sequência, aparecem as rubricas de alimentação (R$ 1,1 milhão) e combustíveis e lubrificantes (R$ 392 mil).
Ao todo, foram identificadas 465 transações operadas por seis servidores que detinham os cartões corporativos — no ano passado, mais de 6.300 funcionários do governo federal tinham acesso a esse meio de pagamento. A assessora Magda Oliveira de Myron Cardoso, da Secretaria-Geral da Presidência, foi quem mais gastou com cartão corporativo durante as viagens de Bolsonaro. Foram R$ 1,6 milhão despendidos por Magda, que acompanhou o ex-presidente em sete viagens à praia. Ela foi exonerada em julho do ano passado.
Transparência parcial
Os dados foram publicados pelo governo Lula. A discriminação de produtos ou serviços adquiridos segue indisponível na internet, mas as notas fiscais foram liberadas para a agência Fiquem Sabendo, especializada em Lei de Acesso à Informação.
A agência escaneou parte da papelada e publicou os arquivos em uma plataforma aberta. Uma das notas fiscais já digitalizadas se refere a uma compra de R$ 19,3 mil, feita no Carnaval de 2021, no mesmo posto que recebeu o total de R$ 164 mil nas visitas de Bolsonaro a São Francisco do Sul. O documento mostra que foram gastos R$ 8.693,02 em gasolina comum e R$ 10.609,14 em óleo diesel naquela ocasião.
— O fato de a gente ainda ter informações de interesse público em formato físico é, além de preocupante, um descumprimento à Lei de Acesso à Informação. Alguns comprovantes já estão praticamente ilegíveis por causa da vida útil do próprio papel. Se não forem digitalizadas, a gente corre o risco de perder informações importantes — diz Bruno Morassutti, cofundador da Fiquem Sabendo.
Responsável pelo controle das informações referentes cartões corporativos, a Casa Civil não respondeu.
Fonte: G1