
A Polícia Civil de Araçatuba (SP) investiga denúncia feita por moradores na cidade que afirmam terem sido vítimas do golpe da "Pirâmide Financeira", praticado por uma empresa especializada em investimento de capital, que teria como sócios um pastor evangélico, responsável por buscar clientes, e um amigo dele, que atuaria como investidor.
O Hojemais Araçatuba teve acesso a quatro boletins de ocorrência denunciando o caso nos últimos meses e falou com algumas vítimas, que criaram um grupo no aplicativo WhatsApp para discutir ações a serem tomadas. Elas afirmam que o prejuízo somado pode chegar a R$ 2 milhões.
Além de não receber de volta dos valores que investiram, as vítimas relatam que muitas pessoas tiveram imóveis e veículos alienados a pedido dos investigados e também teriam perdido os bens.
A reportagem apurou que as denúncias começaram a ser feitas em meados do ano passado. Todos os boletins de ocorrência foram distribuídos na CPJ (Central de Polícia Judiciária), ao Setor de Crimes Virtuais. Um deles foi arquivado, dois estão sob investigação e o quarto já consta com relatório do Setor e foi encaminhado para instauração de inquérito policial.
Casos
De acordo com o que foi apurado pela reportagem, o primeiro boletim de ocorrência foi registrado em junho do ano passado, contra o pastor, de 28 anos, e o sócio dele, de 39. A vítima é uma mulher que em setembro de 2021 fez um contrato de investimento em aluguel de capital financeiro e ano seguinte, dois aditivos, totalizando R$ 200.000,00 em investimentos.
A empresa contratada foi a VW Investingpro Capital Ltda, que consta como ativa na Receita Federal em consulta feita esta semana no site Transparência. Ela teria sido aberta em agosto de 2021 e está registrada em um endereço no bairro Umuarama.
De acordo com a denunciante, foi a partir de abril de 2022 que os investigados suspenderam o pagamento dos juros previstos no contrato. Ela solicitou o resgate do aporte e eles responderam que haviam perdido todo o dinheiro por problemas administrativos.
Mais dívida
Apesar disso, a dupla teria prometido devolver o dinheiro, fora do prazo previsto em contrato. Para isso, o pastor teria proposto que ela pegasse um empréstimo e investisse em uma plataforma no nome dela. Ele iria operar, gerar renda conseguir devolver o dinheiro.
A vítima refinanciou o próprio carro por R$ 80.000,00, valor estipulado em contrato de confissão de dívida, e entregou o dinheiro ao pastor. Porém, ele novamente não teria cumprido a promessa e retirado R$ 5.000,00 do montante investido, sem autorização.
Mais do mesmo
As vítimas dos outros boletins de ocorrência fizeram o mesmo relato. Em setembro dois homens procuraram a delegacia informando que um deles fez os contratos de investimento entre agosto de 2021 e fevereiro de 2022, totalizando R$ 150 mil, com previsão de receber 10% do valor.
O rendimento foi pago conforme previsto até fevereiro, depois suspenso e os investigados passaram a “enrolar” e deixaram de atender as ligações, de acordo com a vítima. Outro cliente disse que investiu R$ 30 mil, também com a promessa de receber juros de 10%, que foram pagos até fevereiro de 2022.
Outra denunciante esteve na delegacia em outubro relatando ter contratado a consultoria financeira da empesa por meio do pastor e do sócio dele. Inicialmente foram feitos pagamentos sobre os valores investidos, sempre acima de 5%, podendo chegar até 10%.
Resgates
Após retirar alguns rendimentos houve a promessa de remuneração fixa em 10% a partir de R$ 100.000,00 investidos. Assim, foram feitos novos aportes totalizando R$ 103.000,00. Em meados de abril o rendimento prometido deixou de ser pago.
Nesse caso, a investidora recebeu alguns valores mediante parcelamento extrajudicial. Porém, a partir de setembro o dinheiro deixou de ser repassado e ela deixou de receber 25 parcelas de R$ 4.120,00, somando R$ 103.000,00.
Por fim, em novembro outra vítima procurou a polícia denunciando a dupla. Ela relatou ter investido R$ 13 mil com o pastor, ainda em 2021. No final daquele mesmo ano o investidor vendeu o apartamento e investiu mais R$ 37 mil. Porém, em março de 2022 os pagamentos passaram a atrasar e em 5 de maio a empresa anunciou aos clientes que havia suspendido os pagamentos por ter perdido todo o valor.
Providências
A reportagem conseguiu contato com o pastor, que informou ter feito todos os esclarecimentos sobre o assunto aos clientes e que está à disposição da Justiça. O homem indicado como sócio dele na empresa não foi encontrado.
Mulher diz que convencida por pastor, investiu direito de casa e hoje mora de aluguel
O Hojemais Araçatuba falou com umas das primeiras pessoas que investiram na empresa que está sendo investigada pela polícia de Araçatuba por suspeita de promover pirâmide financeira. Ela disse que conhecia o pastor sócio da empresa há algum tempo e que em junho de 2020 ele ficou sabendo que ela estaria vendendo os direitos de uma casa.
De acordo com ela, em outras oportunidades eles haviam conversado sobre bolsa de valores, o investigado havia falado que o sócio dele havia feito um curso e sugeriu a ela que fizesse uma aplicação. Na época, a empresa ainda não havia sido constituída oficialmente.
Segundo a vítima, como durante dois anos os pagamentos dos rendimentos foram feitos normalmente, ela convenceu outras pessoas a também investirem, inclusive os próprios pais.
Eles também teriam oferecido comissão para ela se tornar uma captadora de clientes e pedido a ela que se apresentasse como um caso de sucesso quando fosse questionada por outros investidores.
Carro
A mulher contou ainda que em conversa com o outro sócio da empresa, que seria o responsável por operar os investimentos, ele a questionou se tinha interesse em alugar o carro dela, que estava parado devido à pandemia. Posteriormente, ele a teria convencido a vendê-lo a um valor abaixo do mercado e investir o dinheiro.
Quando ela o procurou dizendo que precisava comprar um carro, pois a pandemia já estava mais branda, ele teria sugerido que ela fizesse um financiamento. A sugestão dele foi que aplicasse o dinheiro obtido com o banco, comprasse o carro também financiado e pagasse as parcelas com os rendimentos, o que teria sido feito.
Atrasos
Segundo a vítima, no início do ano passado os repasses dos valores atrasaram, passaram a ser feitos de forma parcelada e ela ficou em uma situação difícil, pois não tinha outra fonte de renda. Questionados, os responsáveis pela empresa teriam alegado que o dinheiro estava preso em uma corretora e iria demorar para ser liberado.
De acordo com a mulher, a situação piorou em abril e em maio ela não tinha dinheiro sequer para pagar as despesas de casa. "Teve mês que eu precisei pegar um boleto e pedir para ele pagar com o dinheiro que me devia, pois eu não tinha de onde tirar", comenta.
Responsabilidade
Segundo a vítima, o investidor assumiu a responsabilidade, mas depois passou a jogar a culpa no pastor e em pessoas que trabalhavam com ele. Por fim, ela comenta que o operador dos recursos não é localizado e o pastor, sempre que questionado sobre o dinheiro, diz que vai pagar, mas conta uma história triste e nada acontece.
"Eu decidi procurar a polícia porque descobri que havia outras pessoas na mesma situação. Como a Justiça não garante que a gente vai receber, estamos pedindo a Deus, porque só ele é que pode nos ajudar", conclui.
Sócios trocam acusações e vítimas ficam no prejuízo
Uma das mulheres que denunciou à polícia ter perdido dinheiro e um carro com os investimentos feitos na empresa, diz que ao procurar informações, os sócios trocam acusações, mas nenhuma providência é tomada, apesar de as denúncias terem sido feitas no semestre passado.
Ela contou que um amigo dela, que era conhecido do pastor evangélico e trabalhava como captador de clientes, mediante comissão, foi quem a convenceu a investir, com a promessa de que receberia 10% mensalmente.
Inicialmente os pagamentos foram feitos regularmente, ela fez mais dois aportes, até que em março do ano passado os repasses dos juros passaram a atrasar. Segundo a vítima, ao questionar o pastor, pois foi por intermédio dele que ela entrou no negócio, ele alegou que o sócio, que seria o operador do dinheiro nas aplicações financeiras, teria perdido o dinheiro investido.
Comprovantes
A vítima informa que pediu os extratos das plataformas, para que pudesse conferir as aplicações, mas ele teria se esquivado, por isso ela procurou o outro sócio da empresa, que alegou que o pastor e um irmão dele, que seria advogado, que teriam desviado o dinheiro investido.
Segundo a mulher, ela ingressou com uma ação na Justiça, houve a promessa de fazer o pagamento e o pastor sugeriu que ela refinanciasse o próprio carro e investisse o dinheiro em outra plataforma, para pagar as prestações com o resgate dos juros. Ela seguiu a sugestão, porém não recebeu o que lhe era devido e o investidor ainda teria resgatado R$ 5.000,00 sem a autorização dela.
Mais vítimas
A mulher conta que passou a investigar a situação, descobriu várias pessoas na mesma situação, sendo que algumas delas haviam procurado um escritório de advocacia, feito acordos, e mesmo assim não receberam.
Segundo a vítima, o sócio do pastor chegou a prestar depoimento na polícia, mas não teria apresentado os extratos dos investimentos feitos com o dinheiro dos clientes.
Por fim, ela diz que ele deixou a cidade com os familiares, enquanto o pastor alega ser inocente, mas tentou convencê-la a fazer novos investimentos com a promessa de recuperar o dinheiro investido, o que não foi aceito.
Fonte: HojeMais